segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Encontro Às Cegas - 227 Dias Para Arrumar Namorado - Carolina Aguirre

Sinopse: Lucía é uma mulher de 30 anos, com uns quilinhos a mais, que ganha pouco, mora sozinha e leva uma vida meio sem graça. Sua vida até então monótona (casa, trabalho, casa) muda radicalmente quando Irina, sua irmã mais nova – e perfeita – anuncia que irá se casar. Ela teria ficado superfeliz com a notícia, se não tivesse sido vítima de uma aposta entre sua própria mãe e irmã: convencida de que Lucía será uma solteirona, sua mãe diz que pagará toda a festa se ela aparecer no casamento acompanhada por um namorado de verdade. Morta de raiva, Lucía decide desafiar a “profecia materna”. Ela tem sete meses e meio para conseguir um namorado e está disposta a fazer qualquer coisa para isso: sair com colegas de trabalho, resgatar velhos amores, tentar encontros pela internet. Encontro às cegas é um diário de uma mulher sobre uma busca cheia de situações inacreditáveis, porém reais, emocionantes, cruéis e divertidas.

Capítulo 1 -  Ontem eu devia ter matado a minha mãe e a minha irmã, mas, em vez disso, comi meia torta de limão e chorei. Minha irmã mais nova, Irina, nos convidou para jantar em sua casa para fazer uma surpresa: anunciou que vai se casar dentro de sete meses e meio. A notícia não surpreendeu ninguém. Ela está namorando há quatro anos, e sempre soubemos que a sua solteirice terminaria dessa forma: com um namorado impecável, uma relação perfeita e um casamento dos sonhos.

E então fizemos o que devia ser feito: festejamos. Brindamos, comemos coisas gostosas, discutimos um pouco, olhamos modelos de vestido em uma revista e criamos um cardápio imaginário jogadas no sofá da sala. Tudo parecia ir relativamente bem (o que já é muito na minha família) até a hora do café, quando, enquanto eu lavava as mãos no banheiro, tive a maior surpresa da minha vida: escutei sem querer uma conversa que ainda é difícil acreditar que foi real.

Minha mãe dizia para a minha irmã que esse casamento seria muito difícil para mim, porque eu era a mais velha das duas (tenho trinta anos e ela, vinte e sete) e a que deveria ter casado primeiro. Disse que eu tinha o pior trabalho (sou jornalista e ganho uma miséria, é verdade), que não tinha namorado (como ela sabe?), que estava gorda (tenho uns doze quilos a mais) e que eu não tinha um objetivo na vida (o que também é verdade). Mas isso não foi o pior. O pior foi o final. Ela disse que o casamento seria uma tragédia dupla, porque a minha família sofreria tanto quanto eu ao me ver dançar sozinha e bêbada enquanto a minha irmã mais nova se casava com o amor de sua vida.

Minha irmã, entretanto, não concordou com ela. Perguntou como ela podia saber se eu estava ou não sozinha.

– Talvez ela esteja com alguém que a gente não conhece.

Mas minha mãe disse que sabia que eu iria sozinha por uma razão muito simples: eu sempre ia sozinha a todos os lugares. Minha irmã disse a ela que não. Minha mãe disse que sim. Minha irmã, que não. Minha mãe, que sim. E a conversa foi esquentando até que (eu escrevo, mas ainda não acredito) minha mãe disse que, se eu não fosse sozinha, deprimida e vestida de preto ao casamento (qual é o problema do preto?), ela pagaria todos os gastos da festa. De fato, quando saí do banheiro, elas estavam apertando as mãos.

Para dissimular, fingi que ia para a sala, mas fiquei no corredor e continuei escutando. Minha mãe impôs condições: a aposta não valeria se eu levasse um candidato emprestado, ou seja (cito textualmente), “companheiros de trabalho, garotos de programa ou qualquer pessoa que fizesse o favor de me acompanhar”. Disse que tinha que ser um namorado de verdade.

Depois falou um tempão sobre mim, mas, por mais que me esforce, não consigo me lembrar do que ela disse. Tenho um tipo de bloqueio. As frases se enroscam como uma erva daninha no meu cérebro. Só sei que tive que me apoiar na parede para não cair no chão. Me senti tão mal que, depois de ouvir a conversa das duas, não falei mais nada a noite inteira. Não disse nada. Não conseguia ouvir mais do que os meus próprios pensamentos. Nem sequer consegui pedir que me passassem o açúcar, porque, cada vez que tentava falar, as palavras não saíam.

Ainda entorpecida, voltei para a mesa e comi três pedaços de torta de limão em cinco minutos, perante o olhar atônito da minha mãe, que servia o chá, escandalizada com a minha gula. Eu nem sequer olhava para ela. Só comia. Sabia que tinha merengue nos lábios e não limpei. Estava catatônica e olhava para a parede como um doente mental em um hospício. Se nesse momento entrassem ladrões em casa, acho que nem teria corrido. Teria ficado ali, consumida pelo medo e pelo merengue, rezando para morrer.

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